terça-feira, 2 de junho de 2009

ATEÍSMO - UMA PERSPECTIVA



Minha idéia aqui é esclarecer o tipo de ateísmo que acredito ser o “correto”, ou melhor, como vejo a questão e seus valores relacionados à emancipação de nossa espécie como humanos. Ainda que eu tente ser totalmente neutro, inegavelmente é um registro de pensamentos e como qualquer outro valor ou julgamento, acaba sendo também uma ideologia, um ponto de vista, entre tantos possíveis, então não faça um julgamento radical sobre este ser um parecer único, inquestionável e de plena razão, pois não é. O maior intuito aqui, é trazer a dúvida, a reflexão, e gerar em cada um a vontade e a capacidade de pensar e desenvolver seu próprio ponto de vista.
Diferentemente de uma religião, as idéias aqui expostas não trazem dogmas, fatos baseados em convicção e certeza, e tudo está aberto para discussão, porém jamais sem fundamentos ou com bases em discursos teológicos onde a Bíblia é aceita como verdade e milagres como fundamentos, etc.
“Um outro sinal distintivo dos teólogos é a sua incapacidade filológica. Entendo aqui por filologia (...) a arte de bem ler – de saber distinguir os fatos, sem estar a falseá-los por interpretações, sem perder, no desejo de compreender, a precaução, a paciência e a finesse”. Nietzsche em O Anticristo.
Por estarmos no ocidente, o foco principal será toda e qualquer religião cristã, até pelo fato de ser de melhor domínio (meu e provavelmente seu), mas os aspectos são válidos para qualquer crença ou religião, pagã ou não, e aspectos metafísicos serão desprezados.
Religião aqui tratará de judaísmo, cristianismo e islamismo (foco em cristianismo e superficialidade nas outras duas), lembrando que as três possuem origem no mesmo lugar geográfico e ainda, no mesmo deus.
Ateísmo é a total descrença na existência de deus, qualquer um. Pode surgir pelo simples ceticismo de um ser pensante pela incrível estrutura mística das religiões que é tão paradoxal, incompreensível ou sem fundamentos reais, ou pela simples dificuldade de ter fé.
Vale a pena lembrar o filósofo Montaigne: “Para os cristãos, encontrar algo inacreditável é uma bela ocasião para acreditar” e ainda: “Os homens tendem a acreditar, sobretudo naquilo que menos compreendem”.
Há graus de ateísmo, indo de afirmações rigorosas sobre a não existência de qualquer deus a apenas descrença simples sobre a existência de algum deus, o que pode classificar os ateus em ativos e passivos. O ateu passivo esta presente em todo aquele que é cético, somente isso. O ativo talvez possa ser aceito como uma graduação mais forte e presente de vivência da “não religiosidade”.
Pessoalmente, acho cansativo e desgastante a discussão sobre a existência ou não de um deus e, apesar de não acreditar, vejo como válido para nosso desenvolvimento compreender o tipo de máquina de manipulação que a sociedade cria utilizando deus para, através das religiões, convencer, alienar, manter sob controle e obter lucros com as pessoas e mantendo um grupo ou grupos sociais no poder.
Outro importante aspecto que escapa definitivamente de qualquer deísta é: não acreditar que algo é verdadeiro não é o mesmo que acreditar que algo é falso. Não vejo o ateísmo partilhando de dogmas como acontece com os deístas, que possuem uma certeza convicta da existência de um deus.
Claro, começa a surgir hoje um tipo de ateu que é dogmático, fenômeno que acontece em qualquer área de conhecimento humano, mas isso é condenável e limita a capacidade de desenvolvimento e apreensão da verdade.
Como qualquer outra apreciação de mundo pela razão, a compreensão daquilo que é um ateu terá o aspecto que o próprio ateu lhe dá, e também aquela compreensão que o não ateu tem e muitas vezes, ambas estão erradas. Um ateu é apenas alguém que não acredita em deus, é apenas uma pessoa, e deve ser apreciada por seus valores, principalmente os éticos, sem se considerar deus como algo que aquele que crê torna se melhor ou pior, pois aí surge a intolerância. Não posso deixar de lembrar, que a intolerância incrivelmente está presente entre pessoas deístas cristãs, onde uma acha que a religião própria é melhor que a do outro, superando o valor maior que seria o mesmo deus.
As religiões trazem um grande mal em si mesmas que é a moral. Moral não necessita de fundamentação, de lógica, de nada que a legitime, basta que exista. Uma das melhores possibilidades que temos de evoluir como seres humanos é desenvolver a ética, que compreende respeito, aquilo que pode ser bom para um só e para a sociedade, estabelecer normas reais de relacionamento social. Temos mais de 2.000 anos de cristianismo, estudos bíblicos, manipulação de textos e interpretações fantásticas, e tão pouco estudo de ética, o que poderia ter nos levado a uma situação de vida social muito melhor e com menos mortes e guerras em nome de deus.
Não há evidências da existência de deus, nada, nenhuma, tudo é uma questão de fé, que é a convicção plena de que algo é verdade, sem exigir prova, fundamento, nada, é uma confiança depositada em algo ou alguém. Qualquer um que realmente esteja lendo este artigo com um olhar crítico não pode negar que isso é um fato, ainda que possa não estar errado.
Há uma premissa interessante para se questionar a validade da existência de deus, bem, há várias, mas vamos a um exemplo questionador:
Creio que para todos é sensato pensar que nada existe até que se encontrem evidências do contrário. Teístas usam da mesma regra em grande parte do tempo. Teístas não acreditam na existência de centauros ou sereias, porém não podem provar que não existem, ainda que existam marinheiros que digam ter ouvido ou até mesmo visto sereias.
Um ateu do tipo ativo não elimina a possibilidade de existência ou a inexistência de todo e qualquer deus, mas restringe a existência de vários deuses apreciados e reverenciados por várias religiões. Talvez um dia, seja possível demonstrar que não há deus algum, mas talvez isso não venha a acontecer.
Mas, se deus cria, faz mudanças, participa da criação e desenvolvimento do universo, deveriam existir manifestações físicas do fato, ou seja, deveria ser possível realmente detectar um deus por algum princípio, mas isso só acontece pela fé, sem fundamentação ou prova, onde discursos teológicos produzem conteúdos “brizolísticos” na tentativa de legitimar a sua existência. Por outro lado, se deus se afasta da prova física e apenas existe como muitos querem acreditar, sua existência ou não se torna totalmente dispensável.
Diferentes religiões concebem deus de diferentes maneiras e da mesma forma, diferentes ateus de formas distintas.
Há inúmeros tipos de discursos teológicos buscando demonstrar a existência de deus de forma lógica. Mas a lógica neste caso se torna retórica. A lógica somente poderia ser válida se estivesse de acordo com a realidade, e quando isso não acontece, prevalece a realidade.
Diferentemente daquilo que muitos pensam, ateus não são burros, não possuem dogmas, não destroem outras culturas ou religiões (como fazem os teístas), não impõe verdades, e caso lhes seja apresentado fundamento, prova contundente, a grande maioria mudaria de opinião.
Porém, as provas das quais dispomos se limitam a experiências místicas (religiosas) de outros, e isso jamais será o suficiente. Afirmar que deus existe e provar o fato, exige algo indiscutível, universal, testável, extraordinário como a própria existência de deus e tal tipo de evidência nunca foi apresentada.
Há ateus capazes de duvidar até mesmo da existência do Universo, que são céticos para praticamente tudo, porém não há entre as pessoas de fé, algum que realmente duvide da existência de deus, o que faz com que este não busque a verdade, além da palavra escrita na bíblia.
Segundo Nietzsche: “Não posso acreditar num Deus que quer ser louvado o tempo todo”.
Pensar ou considerar que ateus são hostis à religião é relativamente incorreto. A grande maioria dos ateus é neutra, não se importa. Critica, vê as implicações que a religiosidade tem na sociedade, mas não quer “converter” ninguém ao ateísmo, isso não faz sentido. O grande problema está no contrário, pois o ateísmo é ainda visto como socialmente incompatível e inaceitável.
Claro, há historicamente situações como as da ex União Soviética, Stalin, mas aí também havia um interesse de manipulação e não uma idéia de emancipação e evolução. Os excessos cometidos pelo regime excederam qualquer coisa que Marx tenha dito ou idealizado a respeito e sequer politicamente foram fiéis a seus ideais.
Entre as influências religiosas importantes e danosas, está sua força na política, que mesmo em Estados ditos laicos, se impõe e com sua força traz normas, leis e uma moral não ética que toda a sociedade deve engolir.
Somos todos humanos, e por isso, seres sociais e comunais. Um ateu não se torna anti social pela falta da crença em um deus e por outro lado, se uma pessoa precisa de um deus para ser social e seguir certos valores, ela é perigosa, pois se por alguma razão ela perder esta fé, nada restará.
"O homem procura um princípio em nome do qual possa desprezar o homem. Inventa outro mundo para poder caluniar e sujar este; de fato só capta o nada e faz desse nada um Deus, uma verdade, chamados a julgar e condenar esta existência." Nietzsche
Apesar de eu não gosta da palavra, há mais ateus morais que religiosos morais. A questão está focada na hipocrisia e falta de liberdade que aquele que possuí uma fé e uma religião traz consigo. Culpa é uma das maiores seqüelas. Ainda que algo seja socialmente imoral, pode não ser em um determinado grupo, e sem a culpa religiosa é mais fácil ser feliz.
Há ateus “leves” que gostariam que deus existisse, o que nada prova. O fato de cinco bilhões de pessoas acreditarem em algo não torna isso uma verdade.
É curioso notar, que a grande maioria dos ateus já acreditou em deus de alguma forma, porém entre os teístas isso não é uma verdade, o que não lhes mostra que acreditar ou não nada muda a vida e os eventos, ou a responsabilidade que devemos ter socialmente.
Para uma discussão possível e saudável com um ateu é necessário ter um espírito livre e a mente aberta, não vivendo somente do senso comum, ou seja, abrir os olhos para a possibilidade da não existência de deus, e creio que este é o maior objetivo deste artigo.
Para muitas pessoas religiosas, a fundamentação que valida a fé está no futuro, na “pós vida”, na ressurreição em deus e tantas outras coisas semelhantes.
“É cristão todo o ódio contra o intelecto, o orgulho, a coragem, a liberdade, a libertinagem intelectual; o ódio aos sentidos, à alegria dos sentidos, à alegria em geral, é cristão...”
Tem se a errada impressão de que sem uma divindade, um deus, a vida fica desprovida de sentido. Isso não é real; temos objetivos, que no final são os mesmos sem a tal divindade. Todos querem a felicidade, deixar uma colaboração relevante no mundo, etc. A vida possui um grande sentido em si mesma, pois a vida existe e é única, o que a faz mais especial para um ateu, pois é a única.
Não há sentido em acreditar em algo por medo da realidade, em procurar conforto em mitos.
As religiões, além do desrespeito e da intolerância em suas imposições, prejudicam a liberdade de outros sejam estes de outras religiões ou ateus. Preservativos, abortos, aids, tudo é considerado a partir somente da ótica da religião dominante. Sem mencionar a intolerância em relacionamentos e de tantos outros tipos.
Além da difícil comprovação dos fatos bíblicos (não falo dos históricos), mas dos “sentimentais”, as religiões vem transformando a interpretação, os textos, reciclando tudo segundo suas próprias necessidades, inclusive a partir de outras religiões mais antigas e pagãs.
Resumindo:
Estamos em um momento histórico onde o egocentrismo predomina e as religiões não parecem estar trazendo alguma resposta valorosa para um comportamento mais solidário, e ainda colaboram para um maior afastamento das pessoas.
Falta ética no mundo, e as religiões trazem apenas uma moral hipócrita trazendo uma transformação ou melhora quase imperceptíveis, ainda que mantenham um controle social, pois fazer com a que as religiões sumissem de vez (se fosse possível), seria um erro e provavelmente traria problemas sociais sérios.
É importante que sejamos existencialistas e responsáveis, pois as coisas mudam quando mudamos a nós mesmos, sem esperar que “uma força externa” faça o nosso trabalho.
Acreditar por acreditar é senso comum, e isso não pode ser bom. Não acredite simplesmente por achar que seria melhor se assim fosse e considere que toda e qualquer crença é senso comum e deve estar aberta a questionamentos.

Tadziu

domingo, 31 de maio de 2009

Personalidade... o que é?




Personalidade é um termo um tanto banalizado e muito centrado no senso comum, com significados múltiplos, geralmente errôneos.
Entre as variações de significado temos de forma generalizada é uma unidade de um ser, tendendo a uma idéia central de totalidade em sua compreensão e valores aparentes. No senso comum surge também como capacidade de tomar decisões, características marcantes em alguém (ser introvertido ou extrovertido por exemplo) e até mesmo referências a alguém famoso como em “é uma personalidade”, mas isso é banal.
A personalidade pode ser atribuída a uma pessoa, ou a própria pessoa o faz, porém a verdade na descrição da personalidade é apenas uma e é difícil alcançar grande clareza em tal tipo de verdade, e muitas vezes arranhamos a superfície pelas observações possíveis que geram interpretações nem sempre precisas. Se diferente fosse, não cometeríamos certos erros no julgamento tantas vezes à priori que fazemos. Muitas vezes há tentativas de se atribuir valores à personalidade de uma pessoa como sendo boa ou má, o que também me parece um grande erro, uma vez que não somos os mesmos sempre, em qualquer lugar ou com qualquer pessoa, mas um mínimo de personalidade coerente deve existir sempre, e esta é a busca, sendo na auto avaliação ou na avaliação do outro.
A avaliação boa ou má excede os limites da psicologia e não deve ser usada, pois este tipo de juízo de valor é abstrato e não serve para muita coisa.
Nos diferenciamos graças à personalidade, e uma personalidade forte e clara torna às vezes a convivência com outros difícil, então saber lidar com este aspecto de nossa alma é importante, assim como, sabermos o que somos.
Então, temos personalidade, descrita em seus traços mais importantes e relevantes, sendo o grupo de atributos perenes, compreendendo desde caráter, a inteligência e forma de comportamento social.
Entre as diversas teorias que tratam do conceito de personalidade, um dos melhores significados que encontrei é: organização dinâmica dos aspectos cognitivos, afetivos, fisiológicos e morfológicos do indivíduo”.
Há também conceitos de uma personalidade básica, onde encontramos tendências, valores, sentimentos, atitudes, emoções relacionadas à vida em sociedade, então o diferencia, o torna original em suas particularidades e a partir destes valores podemos imaginar, ainda que hipoteticamente como alguém age em determinadas situações.

Personalidade não é algo fixo e evolui graças à organização interna de cada um de nós. Apesar disso, em psicanálise encontramos conceitos sobre formação de sua estrutura, onde esta já se forma aos 4 ou 5 anos de idade. Piaget defende que isso ocorre entre os 8 ou 12 anos. Eu penso que não temos nunca uma personalidade já definida, pois aprendemos, podemos mudar, somos seres que se adaptam muito bem a qualquer situação.
Então, não podemos nos esquecer também, que existem aqueles que “não possuem personalidade”, não como algo íntegro, conhecido e verdadeiro, e daí também, observar que há muitos distúrbios da personalidade, patologias diversas, gerando até mesmo a personalidade múltipla.
Não são poucas as variantes de transtornos relacionados a personalidade, sendo algumas patológicas. Não vou me ater a descrever os tipos, mas tais transtornos afetam a personalidade dos indivíduos atrapalhando sua capacidade de apreciar o mundo e de se relacionar com as pessoas, pois tira a realidade dos fatos, mescla emoções diferentes, traz um estilo de vida mal adaptado ou começa a criar um mundo de conveniências, e um mundo assim não é real.
Os transtornos de personalidade variam e se caracterizam pelo medo, dificuldade de lidar com a realidade, sensações de solidão, medo de abandono, afastamento de quem julgam importantes em sua vida e outros.

Daí surge também o medo de novas situações, a criação de situações que não existem, e comportamentos que antes não foram observados podem agora ter uma apreciação válida graças às limitações e fantasias.


Temos aqui elementos interessantes para pensar, para uma auto avaliação e avaliação de outras pessoas.

Este texto complementa o anterior sobre “CONHECER A SI E AOS OUTROS”

Tadziu

domingo, 24 de maio de 2009

CONHECER A SI E AOS OUTROS




Tenho por hábito tentar explorar e compreender o que penso, sinto e faço. Mesmo antes de Sócrates, nascido em 470 a.C. ter me sido apresentado tendo como uma de suas máximas o “conhece te a si mesmo”, eu já tentava trilhar por estes caminhos tortuosos encontrando muitas vezes respostas não exatamente agradáveis, ou do tipo que eu gostaria de ter.

O importante também e pensar no “conheça o próximo”, pois isso evita surpresas desagradáveis e ajuda a imaginar como podemos agir e como realmente o outro é em ética e valores como egoísmo entre tantos outros.

O aspecto mais difícil em tais buscas é a compreensão do inconsciente, pois estamos sempre arriscados a errar na interpretação, seja do próprio ou do outro. Como já nos dizia Nietzsche: ““Todos os julgamentos instintivos são míopes em relação à cadeia das conseqüências: aconselham o que convém ser feito em primeiro lugar”.
Porém resta nos a experiência vivida e apreciada a posteriori, seja esta a própria o a que podemos apreciar no próximo. Lembro ainda, que tentar avaliar e compreender o inconsciente não deve estar somente nas questões mais comumente compreendidas pelo senso comum, como neuroses, psicopatias diversas e outros, mas especialmente naquilo que observamos que nos mostra quem somos e quem os outros são.

Não há aqui questões místicas. Quem me conhece um pouco sabe que sou cético, ainda que não a um ponto onde o ceticismo limite o conhecimento, porém desconfiado como possibilidade de sempre aprender mais. As vivências sociais, especialmente as que trazem em si valores emocionais, são de especial valor para se poder medir coisas, como valores de felicidade e satisfação.

Existe também no senso comum, dizeres do tipo: “só o tempo mostra como as coisas são” e também “o tempo resolve coisas”, entre tantas outras referências citando o valor do tempo.
Inegavelmente estamos submetidos ao tempo, e existimos no tempo e no espaço, ambas as coisas estão diretamente relacionadas.

Aquele que nos dá grande satisfação e prazer pode ser o mesmo que nos trará um grande inferno pessoal. A relação é direta, pois é mais fácil compreender o que é doce conhecendo o fel e vice versa. Um certo equilíbrio mental vem de nossa capacidade de não alimentar ou exacerbar qualidades e defeitos nas pessoas, e também de não alimentar expectativas. É um caminho válido para evitar mágoas e frustrações, pois muitas vezes, geramos ansiedade graças a expectativas, mesmo quando imaginamos que há algo errado e que a expectativa boa não se realizará. Então, aprender a lidar com o tempo passa a ter uma importância vital.
Somos seres sociais, comunais, não podemos viver isolados e a realidade não está em uma possibilidade de exclusão do convívio com outras pessoas.

Mas, aí surgem os riscos e a questão mais importante: como podemos realmente conhecer uma outra pessoa? Como saber qual é a essência de alguém? Imaginemos então uma pessoa hedonista, narcisista e egoísta. Caso realmente seja possível identificar tal tipo de pessoa, que tipo de valor ou apreciação é possível construir a respeito dela? No mínimo, saberemos que não é possível que esta pessoa esteja feliz ou satisfeita.

Apesar disso, mesmo tendo tal tipo de conhecimento, bizarramente ás vezes nos sentimos incomodados, como que tendo sido enganados (apesar de ter sido um erro nosso), e o julgamento de infelicidade própria torna se errôneo, pois no geral e na verdade, isso não mais importa.

Alguns dos aspectos de nosso sofrimento muitas vezes está apenas relacionado a algum tipo de injustiça ou ingratidão, mas não estamos em locais ou posições onde podemos realmente fazer com que isso mude, e os fatos continuam iguais, os mesmos, como sempre foram ainda que não tenhamos notado antes, e continuamos em uma expectativa irreal de poder mudar algo que acaba sendo apenas uma expectativa em algo que é totalmente externo a nós.

É uma de nossas impotências e devemos aprender a lidar com elas. Podemos tentar conseguir alguma paz cuidando de nossos próprios valores e dividindo o que tempos de conteúdo bom, pois de outra maneira perdemos o norteamento daquilo que realmente somos.

Apesar de estarmos hoje muito distantes daquilo que possamos chamar de natureza (original), não perdemos quase nada relacionado aos instintos de sobrevivência e auto preservação, e lidaremos com isso pelo resto da vida.
Daí, temos as pessoas próximas, amigos, gente de confiança com quem podemos realizar trocas de valores, de visão de mundo, de sentido para as coisas e de superação das frustrações.

É curioso quando podemos avaliar as transformações de uma pessoa à distância, especialmente se esta está realmente distante de nós por ter causado mágoa, decepção, por ter sido falsa, vendido uma imagem de algo que nunca foi, etc. É um dos melhores e mais frutíferos campos para a auto avaliação de nossas capacidades cognitivas emocionais e um exercício no mínimo interessante para confirmar que nos enganamos, que a realidade muitas vezes é semelhante às sombras vistas pelos presos na caverna de Platão (leia o Mito da Caverna de Platão).

Temos também uma tendência não muito produtiva de nos atermos ao diagnóstico de si mesmos e do outro. Um diagnóstico de pouco serve, não é suficientemente ontológico para gerar mudanças significativas e às vezes se torna um tipo de perversão.

O melhor que podemos e devemos fazer é escolher um grupo saudável de amigos para dividir amizade e afetividade, o que é difícil nos dias atuais graças ao excessivo egocentrismo social. A grande busca de paz deve estar centrada em:

- lidar bem com o “não”, tanto em dizer como em ouvir;
- não viver relações fracassadas, não estender o desprazer;
- evitar a convivência e qualquer tipo de contato com aquele que nos causa algum tipo de incômodo profundo;
- aprender a mandar pessoas para a pqp, mandar tomar no c... ou ir se f... também faz parte de sentir-se melhor e demonstrar que já compreendeu a essência de tal pessoa ou da coisa toda em si.

Não podemos nos lamentar pelo fato de determinada pessoa não ter conseguido com a experiência e a vivência se transformar em algo melhor. Não podemos sentir culpa por não ter notado traços importantes de personalidade e caráter, pois não é possível criar uma nova ordem mental em outra pessoa, a menos que esta já tenha uma predisposição ou queira.
Não estou insinuando que não devemos lutar ou tentar transformar pessoas e coisas, mas há um limite e devemos lutar por nós a partir de certo ponto, ainda que isso seja algo deveras pragmático. A fome exagerada pela compreensão excede nossa necessidade real e a fantasia não consumada nos trás sofrimento pelo passado que já não importa mais. Devemos buscar plenitude, não menos que isso, mas com a consciência de seus limites, pois a busca será eterna.

A verdade é que há um drama em nossa criação que nos faz muitas vezes perder as esperanças graças a uma experiência péssima o que gera uma ansiedade graças a nossa incapacidade de avaliar sempre corretamente os fatos. Usamos o medo para enterrar este nosso legado.

Precisamos estar aptos para amar e isso só pode acontecer se dominarmos o medo do sofrimento, e geralmente, já temos vivências dolorosas para saber que a dor é superável e que a manipulação é cretina.
O que pode nos nortear na verdade em relações humanas talvez seja a gratidão e a troca, não uma troca comercial e não uma gratidão obrigatória, mas tudo dentro de um conceito de gratuidade.

Nossa capacidade de qualificar e classificar o tipo de impacto que temos no outro é também fundamental na preservação das relações saudáveis. Pense em sedução, que é uma prova máxima de desejo de conseguir algo ou de estar com alguém, que é tantas vezes usada como poder, exploração, extorsão do melhor que o outro pode ter. Então, temos um problema a tratar e pensar com relação a doação verdadeira, pois buscar segurança e poder não é nobre e sequer ético, e provoca apenas mais exploração.

Mas as pessoas mudam, podem mudar. Travar a capacidade de emancipação do ser humano em um senso comum de “as pessoas não mudam” não é algo bom, mas elas podem e muitas vezes devem mudar longe de nós, ou, viver como são, com pessoas semelhantes, ainda que passem a viver de mentiras.

Realidade, a soma de todas as obrigações e como diria Sartre, também de nossas angústias, que para ele é a nossa consciência da liberdade, o que dificulta o prazer. Fugir da realidade é admitir a frustração e estar inserido em uma situação, mesmo contra a própria vontade.
Compreender um processo é um grande fator libertador. Para nos libertarmos de pessoas e coisas que nos amarguram, devemos provar a nós mesmos que os eventos ou pessoas realmente nos incomodam, ou o problema se torna interno nosso. Ter um espaço para sonhar é apenas uma forma saudável de garantia de superação, então assim mantemos a força e também a esperança em pessoas melhores, coisas melhores, melhores amores, etc.
Toda e qualquer aquisição e desejo traz consigo aspectos negativos, mas a essência de uma vida plena está no equilíbrio da realidade, da verdade e do sonho que trazemos em nós, o que nos permite errar.
Somente satisfações superficiais ou passageiras nos trarão sofrimentos futuros, e nada mais.
Não devemos nos desviar de fatos certos como as prioridades em amizade, troca afetiva, solidariedade, pois sem isso entraremos em uma vida triste e de tédio. Sendo boa ou não, não devemos remoer sobre se merecemos ou não certa coisa, esteja ela no passado ou futuro, pois isso alimenta culpa. Devemos lutar contra o conformismo e a desistência, e devemos desistir totalmente de nosso passado, realmente eliminando pessoas de nosso mundo.

Há situações onde não conseguimos facilmente nos livrar de enredos de mágoa, ódio, e imaginamos formas mesquinhas para uma possível vingança, o que reforça comportamentos neuróticos. Isso é tudo besteira.

Devemos aceitas nossas críticas e as críticas feitas por amigos de confiança, devemos reagir e agir de forma positiva, ainda que seja difícil, e superar coisas e pessoas da mesma forma que se supera um vício.

A melhor solução ainda é o aprofundamento de nossa consciência sobre nós mesmos e sobre as coisas próximas, mesmo que não seja possível a sua compreensão total e as atitudes possíveis.

Então? Vamos nos livrar totalmente de tudo e todos que nada valem ignorando a existência e vivendo uma realidade melhor?

Vamos mandar parte do mundo para a pqp e viver com a parte melhor dele?

Tadziu

sexta-feira, 8 de maio de 2009

Nietzsche e o Eterno Retorno


Nietzsche não finalizou o conceito, mas ele aparece em algumas das obras, como em “Assim Falou Zaratustra”, que já li algumas vezes, e em “A gaia ciência”, que anda não li. Em “Além do bem e do mal”, uma das melhores obras para se refletir sobre o homem e em trechos de fragmentos reunidos por sua irmã posteriormente, também há referências ao Eterno Retorno. O próprio Nietzsche considerava o pensamento amedrontador e o teve durante uma caminhada contemplando uma formação rochosa.
O Eterno Retorno refere-se a ciclos repetitivos da vida, pois estaríamos sempre presos a um limitado número de fatos, que aconteceram no passado, são repetidos no presente e serão também repetidos no futuro, como guerras e epidemias. Pessoalmente, acho excessivamente drástica tal afirmação e ainda, ela nos limita em questões de evolução e convívio social quando pensamos em guerras. Epidemias em teoria, podem ser controladas graças à ciência, e ainda que venham a acontecer, a maior probabilidade é de que as proporções destas sejam cada vez menores, ou, surja uma epidemia de proporções “bíblicas”, totalmente fora de controle, o que não seria exatamente uma repetição.
Acredito também, que como seres únicos, nem sempre cometemos os mesmos erros. Quando tendemos a repetir o mesmo erro, podemos interpretar isso como um traço patológico mental. O Eterno Retorno é insensato e não leva em conta a percepção real do tempo, pois não trata de um ciclo temporal que se repete ao longo da eternidade indefinidamente, pois as coisas mudam, as avaliações e valores culturas também, etc.
Podemos notar ainda, que Nietzsche em textos relacionados a História, não coloca o Tempo como algo cíclico, então parece haver um erro na questão. De qualquer forma, como digo no início, não é uma coisa terminada por ele.
Nietzsche com o Eterno Retorno questiona a ordem das coisas. Bem e Mal, angústia e prazer, são fases complementares da realidade e se alternam para sempre na eternidade, que não tem objetivo ou finalidade, então a alternância não cessa nunca. Sendo o tempo infinito e as forças em conflito se combinam de forma finita, as coisas se repetem em algum momento infinitamente.
Há também relações entre Eterno Retorno e Amor fati (Amor ao destino), e a vontade de potência.
Amamos ou não a vida? O Eterno Retorno questiona se seríamos capazes de amar a vida e vivê-la tal como é com as repetições de coisas boas e ruins. Além de prazer, vivemos também a dor, além da guerra, também a paz... Podemos amar a vida sendo que tudo se repete nela?
única vida que temos - a ponto de querer vivê-la tal e qual ela é, sem a menor alteração, infinitas vezes ao longo da eternidade? Temos tal amor ao nosso destino? - Eis a grande indagação que é o Eterno Retorno.
Uma última consideração sobre o Eterno Retorno é um dos maiores problemas da filosofia: podemos estar além do bem e do mal e sentir a vida de forma ontológica como única e múltipla e ainda assim amá-la? E ainda: fazer bem feito e com alegria tudo a cada instante, pois tudo se repetirá para sempre?
Vejo isso como um tipo de estagnação e limitação. Devemos desenvolver meios para que as repetições aconteçam somente com aquilo que é bom.
Tadziu

domingo, 3 de maio de 2009

Idéias Evolutivas


Gosto dos pontos de vista de Sartre sobre muitos temas. A questão é realmente transcender na busca de algo melhor, superior, compreendendo o que é liberdade e o que podemos fazer com ela.

A filosofia sartreana nos traz coisas como a incapacidade humana em conviver com o vazio de ser. Daí, diz Sartre, que o humano deve ter atitudes que amenizem o drama da “nadificação” da consciência, ou seja, as atitudes do homem com relação ao desconforto estão no mascarar, na tentativa de enganar se para fugir do fato, ou nas palavras do próprio:

Nas palavras de Sartre:
Mas a fuga da angústia não é apenas empenho de alheamento ante o devir: tenta, além disso, desarmar a ameaça do passado. Neste caso, tento escapar de minha própria transcendência, na medida em que sustenta e ultrapassa minha essência. Afirmo que sou minha essência à maneira de ser do Em-si. Ficção eminentemente tranqüilizadora, pois a liberdade estaria enterrada no seio de um ser opaco: na medida em que minha essência não é translucidez e é transcendente na imanência, a liberdade se torna uma de suas propriedades.

A ontologia existencialista pela concepção antropológica é concebida por Sartre pontuando a realidade humana sitiada pelo nada, pelo vazio, assim, pela angústia. Diante do nada da consciência o homem é angústia. O nada e a angústia geram como resposta atitudes de fuga da realidade, o que Sartre chama de conceito de má fé, que se torna uma postura comum na condição humana, encontrada quando definimos ou assumimos uma identidade de alguma forma.

Como diz Sartre em O Ser e o Nada, quando nos definimos como professores, por exemplo, agimos de má fé. Nosso nada é cristalizado na função de ser professor, e assim nos permitimos avaliar o mundo pelo prisma cristalizado em nossa consciência.

O humano refugiado na má fé está nas reflexões de Sartre como possibilidade humana diante do nada de ser.

A consciência não possuí conteúdo e ela é aberta para o mundo na busca de essência: "O primeiro passo de uma filosofia deve ser, portanto, expulsar as coisas da consciência e restabelecer a verdadeira relação entre esta e o mundo, a saber, a consciência como consciência posicional do mundo".

Em Existencialismo é um Humanismo, a definição de Sartre para o homem é angústia, que surge da “nadificação” de seu próprio ser. Pelo fato do homem nada ser ele se torna um ser jogado no mundo, obrigado a viver sua solidão de ser mesclada com a angústia de nada ser. O desamparo é condição permanente na realidade humana. Do nada da consciência vem também outro problema sartreano que é a nossa incapacidade de lidar com o vazio do ser. Para Sartre o humano deve tomar atitudes que tenham como objetivo amenizar o drama da nadificação da consciência.
Segundo Sartre: Mas a fuga da angústia não é apenas empenho de alheamento ante o devir: tenta, além disso, desarmar a ameaça do passado. Neste caso, tento escapar de minha própria transcendência, na medida em que sustenta e ultrapassa minha essência. Afirmo que sou minha essência à maneira de ser do Em-si. Ficção eminentemente tranqüilizadora, pois a liberdade estaria enterrada no seio de um ser opaco: na medida em que minha essência não é translucidez e é transcendente na imanência, a liberdade se torna uma de suas propriedades.

E ainda: "Convém escolher e examinar determinada atitude que, ao mesmo tempo, seja essencial à realidade humana e de tal ordem que a consciência volte sua negação para si, em vez de dirigi-la para fora. Atitude que parece ser a má fé".

A má fé é uma possibilidade como atitude que habita o vazio humano e é uma fuga do nada e da angústia, onde o homem encontra abrigo e nega sua condição ontológica. Assim, ele se esconde em ideologias, éticas ou religiões buscando norteamento para sua existência.


É o nada de ser que permite ao sujeito a condição intrínseca de ser livre. Liberdade para Sartre é possível em um cenário onde a constituição ontológica do sujeito está no nada de ser. Somos livres por sermos nada de ser. O nada da consciência é a liberdade e a possibilidade múltipla para se viver de forma autêntica.

Certo ou errado, complexo ou não, é um tipo de pensamento que nos faz refletir de forma evolutiva, buscando um desenvolvimento como seres únicos que somos e tendendo para algo melhor.


Tadziu

segunda-feira, 6 de abril de 2009

ANIMAIS E ANIMAIS




Estranho período da humanidade, século XXI. Muitos de nós talvez nos século passado tivessem imaginado um mundo melhor, diferente, tolerante, igualitário, mas ainda estamos muito distantes disso e vivemos talvez o pior egocentrismo de todos os tempos, um apogeu do egoísmo e falta de solidariedade.

São várias as perspectivas de apreciação da maldade e do egoísmo do homem, porém não devemos nos esquecer que o mesmo homem que é capaz de atrocidades terríveis, é também capaz de atos de piedade e extrema compaixão, então existe a possibilidade de sermos norteados por ideais melhores.

Segundo Schopenhauer, as ações humanas contém além da maldade e do egoísmo a piedade. Pessoalmente não gosto de piedade, acho um valor “fraco” e muitas vezes hipócrita, porém realmente existe e se manifesta em diferentes situações, chegando até mesmo a ser algo bom e válido dependendo da situação. Para ele, se o mundo é dor, ele pode ser melhor tolerado e suportado com a piedade.

O “bom” em Schopenhauer é o fato dele não considerar ou não lidar bem com as convenções sociais, apesar de se queimar com as mulheres graças a aforismos absurdos, ainda assim ele tem valores inquestionáveis sobre o amor e a vida, onde o amor é um impulso para a vida.

Mas a idéia aqui é tratar também de animais, o que nos inclui. Schopenhauer foi um “recluso” e vivia na companhia de seu cão Atma (alma do mundo), e quando seu cão agira de forma má, ou a descontento, ele sarcasticamente o chamava de bípede, fazendo uma alusão sarcástica ao ser humano.

Schopenhauer tinha seus motivos para não gostar do humano, não era algo gratuito. Em seu contexto ele levava em conta o tipo de organização e importância que o humano dava com relação às condições materiais e espirituais (de sua época), o que parece válido ainda hoje. O homem na época de Schopenhauer não desempenhava um papel que pudesse engendrar uma vida melhor com relações mais amistosas (como hoje).

Lembro que a valorização dos animais também aparece em Nietzsche, Motaigne e alguns outros além de Schopenhauer, que dizia que entre os cães, diferentemente do que ocorre entre os homens, a vontade não é dissimulada pela máscara do pensamento.

Com relação aos animais, ele ainda dizia: “A suposta ausência de direito dos animais, o preconceito de que o nosso procedimento para com eles não tem importância moral, que não existem, como se diz, deveres para com os animais, é justamente uma ignorância revoltante, uma barbaridade do ocidente”.

E ainda: “A piedade com os animais está tão intimamente ligada com a bondade de caráter, que se pode afirmar que quem é cruel com os animais não pode ser bom”.

Então, pensemos em valorizar todo o tipo de vida, e talvez especialmente a dos animais, pois estes saíram do estado de natureza por nossa obra e necessidade, então agora são nossa responsabilidade.

Montaigne comenta sobre os tipos de raciocínio dos homens e dos animais, chegando a insinuar que possuem eventualmente faculdades superiores às nossas. Sobre a comunicação entre nós e os animais ele diz:

"Essa falha que impede nossa comunicação recíproca tanto pode ser atribuída a nós como a eles, que consideramos inferiores. Está ainda por se estabelecer a quem cabe a culpa por não nos entendermos, pois se não penetramos os pensamentos dos animais eles tampouco penetram os nossos e podem assim nos achar tão irracionais quanto nós os achamos".


Nietzsche em “Humano, Demasiado Humano” faz uma crítica direta relacionada à condição do animal: “A fera que há em nós precisa que se lhe minta; a moral é mentira forçada, para que não sejamos dilacerados por ela. Sem os erros, que se encontram nas suposições da moral, o homem teria permanecido animal. Assim, porém, tomou-se por algo de mais elevado e impôs-se leis mais severas. Tem, por isso, um ódio contra os estádios que permaneceram mais próximos da animalidade: donde se há-de explicar o antigo desprezo pelo escravo, como por um não-homem, como por uma coisa.”

E com observações um tanto sarcásticas nos dá a seguinte pérola:

“O macaco é um animal demasiado simpático para que o homem descenda dele”.

Enfim, nas relações entre humanos e humanos e animais, tudo depende de nós. Encontrar caminhos para superar a mesquinhez, o egoísmo, ter solidariedade com todas as coisas vivas, e eliminar tantos “ismos” negativos pendentes só depende de nós.

Amar os animais e respeitar a vida faz parte de nosso processo de evolução e superação, e não estamos indo muito bem nesta emancipação que nos é tão necessária até mesmo para a nossa própria sobrevivência.

Tadziu

domingo, 5 de abril de 2009

BEIJO, SEXO, MORTE - BANALIZAÇÕES




Plena mulher, maçã carnal, lua quente,
espesso aroma de algas, lodo e luz pisados,
que obscura claridade se abre entre tuas pernas?
que antiga noite o homem toca com seus sentidos?
Ai, amar é uma viagem com água e com estrelas,
com ar opresso e bruscas tempestades de farinha:
amar é um combate de relâmpagos e dois corpos
por um só mel derrotados.
Beijo a beijo percorro teu pequeno infinito,
tuas margens, teus rios, teus povoados pequenos,
e o fogo genital transformado em delícia
corre pelos tênues caminhos do sangue
até precipitar-se como um cravo noturno,
até ser e não ser senão na sombra de um raio.
Pablo Neruda


O BEIJO:

Poesia, raramente algo que pode totalizar ou universalizar uma idéia ou valor, porém demonstra emoção, valores, um código qualquer de uma realidade melhor, com afetividade, com alma.

Beijo traz em si uma promessa, ou pelo menos deveria, já foi assim.
Estamos matando aos poucos o valor dos sentimentos, do envolvimento, do prazer real com riscos, substituindo-os por banalidades, prazeres momentâneos sem intimidade e sem troca alguma de afeto, idéias, apenas fluídos.

Claro, há aspectos morais, sociais e outros incluídos na interpretação do valor do beijo. Não estou aqui criticando os “ficantes”, os mais liberais, sequer critico aqueles que optam por posturas sexuais mais “evoluídas”, como praticas sexuais diversas e outras variações. A questão relevante e importante é apenas uma: estar feliz e não sentir o vazio após seus atos e na média, o que vejo é o surgimento do vazio, o crescimento do egocentrismo e a banalização total de aspectos importantes quando se vive em sociedade, como a solidariedade, o companheirismo, a emancipação.

Talvez, quando o ser humano conseguir dominar seus egoísmos, deixar realmente de lado seu egocentrismo, seja possível um amor liberal conforme os ideais dos anos 70, um “amor livre” porém ainda não estamos evoluídos o suficiente para tanto, e enquanto tal tipo de evolução não tem lugar, devemos repensar valores, e ainda, graças a alguns riscos, fazer isso com grande responsabilidade. Talvez futuramente, amor seja algo mais amplo e compreendido de outra maneira, mas hoje pensamos e sentimos de uma forma e a grande maioria, como contra seus próprios conceitos, age de outra, sendo totalmente hipócrita. Há exceções? Sim, para tudo, mas raramente encontro nestes casos.

Infelizmente, ainda não estamos livres de problemas com (DST) – doenças sexualmente transmissíveis. Ainda que, pelo beijo não seja arriscado contrair AIDS, ou outro problema mais sério não tratável, existe sim algum risco relacionado a doenças. Veja (http://www.cdc.gov/hiv/resources/qa/qa17.htm) com alertas do Departamento de Saúde dos EUA sobre os riscos de HIV contraído pelo beijo, ainda que a chance seja remota.



O SEXO:

É curioso notar que prostitutas não beijam. De certa maneira, o beijo traz em si, além de uma promessa de algo mais (que não é necessariamente sexo), uma questão afetiva importante e um tipo de entrosamento e valorização, que pular diretamente para o sexo, em uma situação “normal” é quase impossível. Então, inegavelmente temos aqui um tipo de confirmação do valor e importância do beijo.

Com a banalização do beijo, surge também o mesmo fenômeno relacionado ao sexo propriamente dito. Desde as propagandas que bombardeiam nossas mentes diariamente, “vendendo o que não vendem”, pois nenhuma gostosa vem junto com uma cerveja, ou uma cerveja atraí uma gostosa, o apelo sexual surge em praticamente todos os lugares, por um lado criando fantasias de um tipo de beleza que não existe sem photoshop e por outro, erotizando crianças, o que colabora com o aumento de casos de pedofilia, porém isso raramente é observado ou criticado.
Programas idiotas como o BBB fazem com que pessoas se interessem por aquilo que rola por debaixo dos lençóis e esta curiosidade permanente afasta a todos da realidade e daquilo que realmente pode ter importância, que é o outro e a vida de cada um. Existe aqui uma falsa idéia de liberdade, de uma emancipação emocional que não existe, e trata-se apenas de um programa manipulado para dar audiência, sem grande realidade ou valor.
Por diversas posturas sociais impostas, as coisas foram se transformando, se confundindo em si mesmas e excederam o limite do suportável emocionalmente. Ainda que isso pareça ser um ponto de vista conservador ou “moral” (e detesto conceitos morais, pois estes são fruto da classe dominante, que é hipócrita), não é difícil notar que as coisas não andam bem. Há nos dias atuais um nível de insatisfação perene, ainda que possamos ser mais liberais.
Outra questão interessante é notar, que as “mulheres frutas” (entre outras), apesar de serem em média burras, transmitem uma idéia de liberdade, sensualidade, casualidade, com idéias de bem resolvidas, evoluídas, etc. Porém, na maior parte das entrevistas podemos notar, que a questão é puramente econômica e que cada uma delas gostaria de ter uma família convencional, então notamos que na verdade são ingênuas e mantém alguma “pureza”.
A mídia vende (de forma hipócrita) fantasias e ilusões com sendo fontes de prazer verdadeiro e engendram na sociedade uma confusão emocional sem precedentes. O capitalismo exige que se venda, e não há limites para o que pode ser feito para se atingir o objetivo de vender.
Repito, ainda que você tenha lido o artigo até aqui, e esteja pensando que ele tem caráter moral, olhe a seu redor e note a quantidade de pessoas sozinhas, emocionalmente vazias, sofrendo de ansiedades, angústias, dores que sequer compreende, depressões, e ainda assim, se iludindo procurando a “felicidade” pela forma imposta pela ditadura da mídia.
Sexo pode ser bom enquanto apenas sexo? Sim, às vezes pode, mas exige honestidade, intimidade, algum tipo de compromisso, então, ainda assim, para ser bom não pode ser somente sexo pelo sexo.
Vejo duas hipóteses para soluções possíveis e acredito que ambas são válidas: ou evoluímos realmente e nos tornamos liberais, além da mídia, dentro de nós, de forma verdadeira, ou revemos os valores e deixamos um pouco de lado a banalização.

Em momento algum acredito que sexo não seja bom, que não deva ser praticado, que desejar alguém é errado, etc. Também não acredito em virgindade, não creio que devamos retomar valores da Idade Média, ou que nossos valores sejam regidos por exemplo pela Igreja, mas a sociedade está caindo em contradição e não está feliz.


MORTE:

Há coisas boas acontecendo no mundo e não são poucas. Porém, a mídia nos traz índices de violência, chacinas, guerras, fome, tragédias... isso é feito de maneira tão massificada, que às vezes gera um desespero e uma sensação de que tudo já está perdido e não há mais pelo que lutar.

Houve um tempo, em que andar pelas ruas com outras pessoas por perto era seguro. Havia solidariedade, as pessoas se ajudavam diante de uma ameaça de assalto ou coisa parecida. A criminalidade aumentou, existem mais armas envolvidas na criminalidade, e o plano de desarmamento desarmou somente a população que eventualmente poderia se defender. O próprio governo estimula que não haja reação, que todos devem entregar tudo, o que além de favorecer a criminalidade, traz ainda o fator de abalar ainda mais a solidariedade.

Violência começa a se tornar algo normal, aceito, as pessoas começam a ter medo de sair e raramente se ajudam em uma situação de risco qualquer. Assim, a violência começa a fazer parte da vida de todos como algo que existe naturalmente, sem reação.

Vemos manifestações do tipo “passeata pela paz”, “700 cruzes na praia de Copacabana”, e outras semelhantes. Este tipo de ato se configura em um troféu pela derrota, um símbolo para os que praticam a violência e estão vencendo, nada além disso.

Quando ouvimos sobre um assassinato, sobre uma chacina, não mais damos importância pois já incorporamos isso ao dia a dia, banalizamos totalmente. Mortes são “interessantes” e chamam atenção quando um navio ou avião sofrem um desastre qualquer e pelo menos 200 morrem.

Ninguém mais se revolta, ninguém tem atitudes construtivas, ninguém mais se choca por “pouco”. Quem pode, desfila pelas cidades em carros blindados e com seguranças, quem não pode, se arrisca diariamente e acha tudo natural. Ninguém está feliz neste quadro.

Tadziu